Ontem foi um dos dias mais tristes da minha vida. Morreu abruptamente um miúdo com quem eu lido desde que ele nasceu, o pai dele e o meu são como irmãos, o que fazia do puto meu "primo", fazemos todos os anos anos umas fériazinhas juntos no Algarve e vemo-nos com bastante regularidade, mais que á minha restante familia. A mãe mandou o puto para casa limpar o pó do quarto, ele foi, ligou o msn, agarrou numa chave que tinha escondido da mãe da sua mota nova e foi dar uma voltinha sem ninguem saber, tinha 16 anos, nao tinha licensa para aquela mota e nunca mais voltou... Um jipe saiu de uma estrada sem prioridade, não olhou, bateu no miudo e ele voou 10m e foi aterrar entre dois carros.Rebentou-se todo e morreu ainda na ambulancia. Eu, o meu irmão e meu pai fomos ter ao hospital e aquilo estava cheio de amigos do puto. Os pais dele estavam lá para dentro e ficámos cá fora á espera deles. Quando a mãe saiu e viu cá fora a familia e os amigos todos ficou louca, gritava como eu nunca tinha ouvido ninguem gritar, em negação, a dizer que não acreditava que o filho dela tinha desaparecido.Nunca ouvi nada tão dilacerante como os gritos daquela mulher.
Partiu-me o coração ver o meu irmão a chorar todo destroçado porque o amigo dele tinha morrido, nunca o tinha visto assim. Eles tinham a mesma idade e tratavam-se como dois irmãos que se adoram e têm ambos o mesmo nome, Tiago. O puto tinha feito anos a semana passada e eles dois apanharam uma buba descomunal, o meu irmão filmou com o tlm a parvoeiras que andaram a fazer a noite toda. Agora não consegue deixar de ver os filmes, vezes sem conta. Eu tive a ingrata tarefa de dizer a namorado do miudo que ele tinha morrido, porque ela não parava de ligar para o tlm dele que a mãe apertava com tanta força contra o peito como se fosse o coração do filho. Consegui tirar-lho da mão, estva todo riscado e cheio de sangue e atendi-o. E disse-lhe.
Foda-se, é pena mas só nestas alturas é que penso na vida, na fragilidade dela e no quanto a estou a desperdiçar. Se eu soubesse que morria amanhã era isto que queria estar a fazer hoje? Não mesmo. Mas também não sei se vou morrer amanha ou se vivo mais 70 anos.
Entrei no quarto do puto, ele tinha-lo deixado com se ainda fosse voltar e depressa porque não limpou o pó e a mãe ia-lhe foder a cabeça. Dói mesmo. Porque se sentia a presença dele ali, o msn ligado com bué pessoal a falar com ele, os boxers espalhados no chão, a cama por fazer com o cheiro dele.
É pena eu não acreditar em nada que esteja acima de nós porque traria algum conforto pensar que ele está num lugar melhor, que está com o amigo dele que morreu ha pouco tempo num acidente de carro e que tinha a idade dele. Custa-me acreditar que estas coisas acontecem. Não tinha de acontecer. Ele era um rufiazito, mas não era de má indole.E era tão novinho. Que injustiça. Por uma triste ironia do "destino", ao condutor do jipe tinham-lhe morto o pai naquele mesmo sítio e agora foi ele que, sem ter querido, tirou uma vida.
E de pensar que isto pode acontecer a qualquer pessoa que eu conheço, so tenho vontade de ir ter com cada uma das pessoas que eu adoro, abraçá-las e sentir que tão seguras e dizer-lhes o quanto as amo e quão importantes são para mim, porque do Tiago não tive tempo de me despedir.
E nunca mais o vou ver na minha vida.
